terça-feira, junho 1
Não como um Cipreste
Não como um cipreste,
não todos ao mesmo tempo, não todo de mim,
mas como a erva, em milhares de cautelosos fios verdes,
escondidos como muitas crianças
enquanto outra as procura.
E não como o homem só,
como Saul, que a multidão encontrou
e fez rei.
Mas como a chuva em muitos lugares,
de muitas nuvens, para ser absorvida, para ser bebida
por muitas bocas, para ser respirada
como o ar de todo o ano
e espalhada como rebentos de primavera.
Não a campainha aguda que acorda
o médico guardando o paciente,
mas o toque leve, em muitas pequenas janelas,
com o bater de muitos corações.
E depois da suave saída, como fumo
sem o som estridente do shofar, um estadista demite-se,
crianças cansam-se de brincar,
uma pedra pára de rolar
numa inclinada colina, no lugar
onde começa a planície das grande renúncias,
de onde, como orações respondidas,
se levanta poeira numa miríade de grãos.
Yehuda Amichai (1924-2000), poeta israelita.