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sexta-feira, novembro 26


Retratos VI - Judeus na Primeira Pessoa:
David Grossman


Para mim, ser judeu é ser um estranho.
Um estranho em relação a situações humanas em que se forma um colectivo de qualquer espécie, composto por muitos que falam (ou urram) com uma voz única; um estranho com uma leve suspeita sobre o que torna aquele colectivo possível; com a solidão que toma conta do indivíduo na presença de um colectivo daqueles, mesmo que ele não queira – ou seja incapaz – de fazer parte dele; com o sentido de singularidade que acompanha aquela solidão; com aquela marca (não inteiramente compreensível) de orgulho que acompanha estes sentimentos, afligido incessantemente pelo facto dessa singularidade colocar uma barreira invisível, mas real, entre ele e os outros; com o constante cepticismo que repousa dentro desses sentimentos, porque frequentemente parece que estes sentimentos não são mais do que uma crosta formada sobre a ferida da solidão, da trágica distinção dos Judeus – e quem sabe se foi imposta desde o início aos judeus pelos outros ou se os judeus a escolheram e refinaram – transformou “O Judeu” num símbolo quase universal do estrangeiro absoluto; com a dor do facto desta atitude ter transformado o Judeu e a sua História, aos olhos da humanidade, numa história maior do que a própria vida, e logo em algo que não é parte da própria vida, algo despegado do curso da natureza e da História experimentado por outras nações.
A isto tenho de juntar o profundo e instintivo sentimento de identificação familiar que sinto em relação aos judeus de todas as gerações. Partilho os seus destinos, as suas formas de pensar, a sua cultura, a sua linguagem e o seu humor. Mas talvez, aquilo com que realmente me identifico, mais do que qualquer outra coisa, é precisamente com esse sentido de solidão, ferida e perseguição, esse sentimento de ser estrangeiro neste mundo, sempre angustiado pela delicadeza da existência.
Mas sempre que sinto isto ao identificar-me desta forma como judeu, passo a fazer parte deste colectivo particular, o colectivo judaico, dou um passo atrás, e tenho sérias (e muito judaicas) dúvidas acerca de lhe pertencer.

David Grossman, jornalista e escritor israelita. Retirado do livro “I Am Jewish: Personal Reflections Inspired by the Last Words of Daniel Pearl”, 2004.

::A LER:: David Grossman (bio-biblio) / Books & Writers - David Grossman (bio) / PBS - NOW. Bill Moyers Interviews David Grossman / Público Online “Israel é um milagre e estamos a desperdiçá-lo” / Fora do Mundo: O ÚNICO SÍTIO DA TERRA, Pedro Mexia / Guardian Where death is a way of life, David Grossman / Israel Culture & Arts.

::A OUVIR:: NPR - David Grossman on Israel in Crisis (formato RealAudio)

[Mais Retratos na secção de Judaísmo dos Arquivos da Judiaria]